Foto: Otto Stupakoff
Aos 24 anos, Alice Braga praticamente não tem casa. As malas ainda não desfeitas transbordam roupas pelo chão do apartamento de Los Angeles. Sai pouco para se divertir e quase não convive com os amigos. Não namora há tempos, porque a correria do trabalho não permite. Às vezes, para espantar a solidão, vai ao cinema… Sozinha. E, mesmo assim, ela nunca estevetão feliz.
Alice Braga pintou nas grandes telas em Cidade de Deus, na pele da cocota Angélica. De lá para cá, sua vida virou de ponta-cabeça: ela largou o curso de Artes do Corpo, que fazia na PUC de São Paulo, viajou pelas Américas filmando, conheceu grandes nomes do cinema mundial, fez mais de dez filmes, foi aplaudida de pé em Cannes (e chorou), ganhou oito prêmios importantes (incluídos aí os festivais internacionais de Verona e Miami), apareceu nas principais revistas americanas (Vanity Fair, Nylon, Esquire, you name it!). Enfim, Lili, como é chamada pelos velhos amigos, tirou os últimos cinco anos para conquistar o mundo.
Sendo sobrinha de Sonia Braga, é óbvio que o parentesco com uma das mais populares atrizes brasileiras de todos os tempos não atrapalha. Mas tampouco é a chave do sucesso de Alice. A verdade é que ela pouco conviveu com a tia famosa. Quando Sonia deixou o Brasil depois de ter conquistado o País na pele da sensualíssima Gabriela, Alice ainda era um bebê de colo. O interesse pelas câmeras, ela diz, foi muito mais influência da mãe, a também atriz Ana Braga.
Sonia viveu em Nova York durante toda a infância e adolescência de Alice. E justamente quando Alice instalou-se em Manhattan para participar de sua primeira superprodução hollywoodiana I Am a Legend, filme estrelado por Will Smith e com megaorçamento de US$ 150 milhões , Sonia voltou a morar no Brasil.
Pouco acostumada a megaproduções, Alice não esconde nem um pouco sua surpresa diante da estrutura gigantesca das filmagens de I Am a Legend ao lado de Will Smith. Foi uma loucura! A gente parou a Quinta Avenida e andou quatro quarteirões com a câmera na nossa frente. Em dez minutos havia 600 pessoas na rua, lembra Alice. Quando não estava filmando, gostava mesmo era de bater papo com a equipe técnica.
Com zero de atitude blasé, não escondia de ninguém no set a surpresa por ter chegado onde chegou não fazia tipo nem com Will Smith, a quem, aliás, só tem elogios. A admiração parece ser mútua. Diante dos repetidos comentários de Alice creditando à sorte o fato de ter conseguido papel tão importante, Will respondeu: Sorte não existe. As coisas acontecem quando a preparação encontra a oportunidade.
Para Lili, esse comentário trouxe a certeza de que o trabalho duro está valendo a pena. A preparação para o papel foi pesada. Ela, que é amante declarada de brigadeiro de colher, teve de se contentar em comer praticamente nada para viver a faminta Anna. A dieta foi radical: Não pude comer sal nem açúcar durante oito meses. Nem frutas? Nem frutas! Um morango era tão proibitivo quanto um brigadeiro. Alice perdeu sete quilos, mas isso não significa que tenha entrado para o time das celebridades size zero. Assim que concluiu as filmagens, mandou a dieta para o espaço.
O excesso de trabalho faz Alice viver a vida das personagens quando interpretava Karina, a prostituta do elogiado Cidade Baixa, de Sérgio Machado, tingiu os cabelos pela primeira vez, bebeu, fumou e comeu à vontade. Fiquei bem fortinha, diz no meio de uma gargalhada gostosa. A experiência fez com que concluísse que, definitivamente, nasceu para ser morena. Ser loira não tem nada a ver comigo.
Embora as revistas americanas vendam Alice como sex symbol latino, vaidade nunca fez parte do seu repertório. Na pré-adolescência, por exemplo, estava longe de ser uma das mais desejadas entre os garotos. A Lili de 11 anos era menina gente fina, ótima para jogar bola, mas não para namorar, no comentário geral dos colegas de classe.
Desnecessário dizer que muita coisa mudou: já não corre atrás da bola, mas pode ser vista nas ruas de Los Angeles ou Nova York cumprindo oito quilômetros diários de corrida. As camisas do São Paulo e do Palmeiras cederam lugar a um guarda-roupa mais sofisticado ela era sãopaulina fanática, mas, quando o meia Raí deixou o tricolor, aproveitou para virar palmeirense e agradar ao pai, o jornalista Ninho Moraes. E hoje não há nenhum garoto que não se arrependa daquele comentário da infância.
Mesmo assim, Alice não se sente sex symbol: As mulheres que vejo como sex symbols são muito diferentes de mim. Sou tipo assim: All Star, calça jeans e camiseta. E mesmo aos 24 anos ainda me sinto muito molecona. Será por isso que nunca aceitou os cada vez mais insistentes pedidos para posar nua? A verdade é que Alice tem vergonha. Apesar de falar bastante, de ser toda extrovertida, tenho muita vergonha de me expor.
Interpretar a prostituta em Cidade Baixa, portanto, não deve ter sido fácil há fortes cenas de sexo e nudez total. Quando recebi o roteiro, levei um susto. Mas no final foi uma experiência maravilhosa. Eu não tinha bagagem, então foi meio assim: ou me jogo, ou me jogo. O mais legal é que depois o Sérgio (Machado, diretor) me disse que às vezes eu me jogava mais do que ele esperava.
O filme deixa transparecer isso de forma visceral, no triângulo amoroso que ela forma com Lázaro Ramos e Wagner Moura (o ator global da vez). Após a exibição em Cannes, foram tantos os aplausos que Alice não se conteve e chorou. O filme saiu premiado do festival, e ela bateu asas para novos vôos em terras estrangeiras. Alice Braga está virando uma estrela internacional e de carreira sólida.
E é mais que a latina da vez. No momento, se divide entre as gravações da versão para o cinema de Ensaio Sobre a Cegueira, de José Saramago dirigido por Fernando Meirelles e o filme do cult director David Mamet. Corre na internet que, em seu próximo papel, contracenará com Harrison Ford e Sean Penn. Alice nem confirma nem desmente.
Nascida em São Paulo, no Jardim Paulistano, mas criada na Vila Madalena, ela hoje talvez seja mais conhecida fora que em sua própria terra. No Brasil ainda não é o que se poderia chamar de uma superestrela. Por quê? A resposta é simples: nunca fez novela. Não que tenha preconceitos. Quando foi convidada, outros compromissos com o cinema impediram. Mas ainda sonha um dia trabalhar ao lado de Andréa Beltrão, Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, como toooooodo ator brasileiro!.
Alice quer fazer novela, quer fazer teatro, quer fazer de tudo. Daqui a 20 anos quero estar feliz, em algum lugar do mundo, casada, com filhos. De véu e grinalda? Uma careta antecede a resposta: Véu e grinalda… acho que não, diz com outra de suas típicas gargalhadas. Quero é pegar o cara que eu escolher, juntar meus grandes amigos, tomar um belo de um porre e dançar até o dia amanhecer. E profissionalmente, qual é a meta? Eu quero abraçar o mundo.