A CASA E O DRAMA SEGUNDO FREDERICO DALTON

Fernando poderia pensar que tinha chegado ao fim da linha. Mas como sua imaginação é altamente “estetizada”, ele sempre encontra razões para continuar. Senta-se num banquinho na cozinha suja e mal iluminada como se estivesse posando para Nan Goldin. Sua cama por fazer é uma “instalação” de Tracy Emin. Olha-se no espelho como se fosse um personagem de Bergman e às vezes chora como se o próprio Bergman o dirigisse. Imagina-se sempre visto pelo olhar de um grande artista. E assim sua tristeza fica mais interessante.

Depois de mais uma briga com o filho, Laura se apoiou na mesa da cozinha e começou a pensar que nem sabia mais o que pensar. Por isso não percebeu quando o locutor no rádio atualizou o número de vítimas do tsunami no Japão. Então, se lembrou de que ainda havia roupa para enxaguar. Foi só quando viu a marca do amaciante (“Ternura”), que Laura começou a chorar.

A vidente olha a palma de minha mão esquerda e vê a montanha de louça suja que tenho para lavar. Na minha mão direita ela vê a bagunça em que se encontra minha sala. Compadecida, olha nos meus olhos e desta vez vê a confusão interna do meu guarda-roupa. Mas como é muito educada, a única coisa que me diz é: “Este será um ano de grandes desafios para você”.