E se eu voltasse para o meu amor da Alemanha? Como assim? E tudo o que eu vivi desde que a encontrei pela última vez? Será que todos esses anos foram apenas uma lacuna, um intervalo, um vão? Eu estaria voltando para uma Alemanha agora lotada de refugiados e imigrantes famintos e desesperados. Como explicar a alguém que quase perdeu a vida no Mediterrâneo para estar ali que só vim à Alemanha para dizer a um amor da juventude que eu não devia tê-la abandonado?
Ele olhou pra mim por um instante e continuou caminhando. Mas percebi que seu olhar não retornou imediatamente à cidade ao redor. Permaneceu num intervalo onde não via nada especificamente, onde ainda processava minha imagem num espaço qualquer da memória recentíssima. É neste espaço que eu queria estar com ele agora. O espaço mais secreto do mundo, mas que é tão dele quanto meu. Porque foi para lá que, ainda que só por um instante, o desejo dele me carregou.
Se você estiver numa calçada perto de grandes edifícios de escritórios no Rio de Janeiro na hora do almoço certamente verá homens de roupa social e até terno-e-gravata caminhando com um sorvete na mão. É a sobremesa. E como o intervalo ainda vai durar um pouco, eles caminham tranquilamente, às vezes em pequenos grupos, conversando enquanto saboreiam seu picolé ou casquinha. Gosto de vê-los assim. Isto me dá esperança na humanidade.