Frederico Dalton nos brinda e aos nossos leitores com três minificções e uma bela foto, daquelas que apenas o olhar sensível para o que está ao redor consegue captar e que é a mais perfeita tradução dessas saborosas histórias.
Li numa revista que teve um argentino chamado Jorge Luiz que foi diretor de uma biblioteca mesmo sendo cego! Nossa, fiquei boba! Mas eu entendo. Quando cada um cumpre com sua obrigação a coisa funciona. Por isso não fico no pé do meu marido. Deixo ele solto, mesmo com minhas amigas me criticando por isso. Mas se um dia eu descobrir alguma coisa, eu furo o olho dele! Ah, furo sim.
Sem que ele perceba, sigo meu filho pelas ruas de Botafogo, onde ele está pedindo dinheiro para a festa de calouros. Há momentos em que tenho vontade de arrancá-lo de lá, outros onde acho engraçado o que pintaram no corpo dele. Há também momentos em que tenho vontade de processar a faculdade por obrigarem meu Bruninho a passar por essa vergonha. Mas sei que o constrangimento dele não vai durar muito. Hoje à noite ele já terá arrecadado sua meta. E voltará para casa feliz, sem saber que todas as pessoas que lhe deram dinheiro foram contratadas por mim.
Hoje o quarto estava aberto. Estranho… Vivia trancado. Logo no primeiro dia a patroa tinha falado: “Aqui você não precisa limpar. Coisas do Cézar.” Cézar era o marido, alto funcionário do Ministério de Minas e Energia. Melhor assim. O apartamento funcional na Asa Sul é grande e aquele quarto é logo o maior. Menos trabalho para Luci. Mas hoje ele estava aberto. Os patrões não estavam em casa. No quarto há uma plantação de maconha. Luci não se mete na vida dos patrões. O quarto está imundo. “Será que deixaram aberto para mim limpar?”, pensou ela.
